❗️Valorize os fios brancos
1.
Tenho pensado sobre envelhecer. Alguém aí que já passou dos quarenta, por favor, me responda se isso é normal. Eu tenho ainda memórias muito claras da infância e adolescência. Me lembro dos dias em que estive sentado como aluno na sala onde hoje leciono. Mas se olho pra frente imagino que tenho, mais ou menos, o mesmo tanto pra viver ainda. Não me dá tristeza, nem desespero, nenhum sentimento ruim. Mas, sim, tenho pensado em como vou viver adiante. O que realmente valerá a pena ser vivido?
2.
Poucas semanas atrás nos despedimos do Tio Calinho. Não era meu tio, não diretamente. Ele era irmão da minha sogra, tio da minha esposa. Quando nos casamos eu mal sabia quem ele era. Depois do nosso casamento nunca mais o vi, até o dia que, circunstâncias da vida, ele veio morar com a avó da minha esposa. Foi aí que eu o conheci. Tio Calinho era querido pelas crianças, especialmente pelos meninos. Mesmo com o câncer, o diabetes e a asma ele se fazia presente em todas as ocasiões. Gostava de sentar numa cadeira de plástico vermelha na varanda, ver as crianças brincar e conversar. Eu sei que ele fez escolhas não muito positivas na vida, e que isso o deixava profundamente triste. Certo dia, quando morávamos em Concórdia, ele pediu para ter um tempo comigo no escritório. Naquela tarde o Tio Calinho queria saber se podia encontrar perdão e se mesmo mais velho poderia mudar. Ministrei a ele a absolvição e ele pode compreender que a graça também tinha o alcançado. Hoje eu sei que ele descansou, não apenas das dores físicas, mas também as causadas pelo seu passado. Ele descansou perdoado e amado.
3.
Semana passada também me despedi, ainda que apenas de longe, do meu padrinho Ângelo. Faz muito anos que não pude mais vê-lo. No entanto o que ficou marcado em mim foram os anos da infância nos quais eu, sempre nas férias, passava com eles no sítio. Aprendi a andar a cavalo, pesquei e nada nos riachos e me diverti com eles. Me lembro da voz grave e firme dele, misturada com a alegria e a forma positiva com que ele encarava a vida. Esta lembrança o tempo não apaga.
4.
Despedir-se de pessoas que foram tão próxima, cada uma em uma fase da minha vida, é um lembrete de que os fios de cabelo da minha cabeça diminuem ano a ano e que minha barba está ficando cada vez mais branca. Talvez eu fique um velhinho de cabelos brancos como o nono De Bona, meu avô. Mas mais importante que a aparência é como eu quero envelhecer e o que eu farei daqui pra frente. Tenho que pensar em onde passaremos nossa velhice quando nos aposentarmos. Tenho que pensar na minha saúde, para que eu possa gozar desse tempo com mais tranquilidade. Tenho que pensar também que preciso viver esse tempo que tenho agora com as crianças e não só me fadigar à exaustão pelo trabalho.
5.
Acho que vou ter que fazer minhas resoluções de ano novo já no advento e vou ter que começar pedindo perdão por minha indisciplina com a saúde, meu excesso de trabalho, minha falta de foco e meu presentismo. Preciso aprender urgentemente a incluir o cuidado comigo na agenda, separar trabalho e descanso, focar no que de fato importa, e planejar meu futuro aqui, assim como manter os olhos fitos no futuro que me espera do lado de lá do rio da vida.
6.
Memento mori, lembra-te que és mortal.
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